20 de fev. de 2012

A Umbanda do Futuro e o Futuro da Umbanda - Ensinando o padre a rezar missa parte III


Este artigo foi dividido em três partes bem distintas...

Na PARTE I me dediquei a justificar o título, afirmando que talvez o “padre” não esteja “rezando a missa” de maneira satisfatória.

Na PARTE II explico os 7 Raios que surgem em Deus e que orientam a existência nos 7 Sentidos Divinos, e deixo uma pergunta retórica: Será que as religiões que conhecemos estão cumprindo sua tarefa de estimular a evolução humana nos 7 Sentidos Divinos?

Nesta terceira e última parte, pretendo finalmente alcançar o objetivo descrito no título e, efetivamente, sugerir ao “padre” novas maneiras de “rezar a missa”. Contudo, minhas sugestões não são dirigidas aos padres, nem pretendo falar sobre a missa tradicional, mas da Umbanda, uma religião genuinamente brasileira, ainda muito jovem e promissora e de caráter universalista.

Este artigo é portanto dirigido aos médiuns e dirigentes de Umbanda.



A Umbanda, surgida na mistura entre as religiões de origem africana com o Adjunto de Juremá praticado pelos nossos índios, recebendo influência católica (sincretismo) e posteriormente também kardecista, existe no plano material há pouco mais de um século, tempo relativamente curto, se comparada a outras religiões.

Hoje, quando olhamos para as religiões, elas nos parecem completamente resolvidas (e estagnadas) com seus dogmas e livros de regras, mas nem sempre foi assim. A Bíblia, livro sagrado que serve de fundamento a tantas religiões cristãs, demorou quase 2 séculos sendo escrita e outros tantos sendo discutida, antes de ter sua versão “final” que conhecemos.

A Umbanda é hoje uma religião promissora em sua prática simples e objetiva, em sua universalidade e multidisciplinaridade, mas – ao contrário do que acreditam muitos dirigentes – não é uma religião pronta.

Particularmente acho ótimo que assim seja, temos a oportunidade – e a responsabilidade – de construir a Umbanda que permanecerá, não lidamos com nenhuma estrutura rígida e estagnada imposta de cima para baixo por clérigos com intenções politicas e/ou mercantilistas. A Umbanda que hora existe é aquela que fazemos existir no trabalho cotidiano das terreiras e, a Umbanda que existirá será aquela que construiremos no decorrer das próximas décadas (ou séculos) de prática umbandista.

Não convém elencar neste pequeno artigo as circunstâncias que motivaram o surgimento da Umbanda e tampouco as diferentes circunstâncias que justificaram algumas tendências adotadas na prática cotidiana. O passado é uma estrada que nos conduziu até o presente, e é no presente que devemos construir a estrada que nos conduzirá ao futuro e ao futuro da Umbanda.

Retomo aqui o título desta série de artigos: ENSINANDO O PADRE A REZAR MISSA, porque disto consistirão as linhas seguintes, apontar práticas e mitos que surgiram no passado umbandista e que – no meu entendimento – devem ser modificados na construção do futuro.


O Mito do Médium Cavalo

Não se trata aqui apenas do aspecto ofensivo existente na maneira como os médiuns são nomeados (até mesmo pelos guias) nas terreiras de Umbanda, mas dos conceitos por detrás destas nomenclaturas.

O que é um cavalo?

O cavalo é um animal irracional que pode ser adestrado para servir ao homem, transportando-o e deixando-se conduzir por este. Um “cavalo” bem adestrado – à exemplo de um médium bem treinado – é aquele que aceita a condução do cavaleiro sem impor resistência, dócil e obediente.

Outra maneira de nomear os médiuns é Aparelho.

Um aparelho é pouco mais que uma ferramenta, diria uma ferramenta complexa, com alguma tecnologia, que requer certo conhecimento para ser manipulada, mas ainda uma ferramenta.

Cavalo e Aparelho são elementos sem vontade própria e ilustram um padrão adotado pela mediunidade ao longo da história, a mediunidade inconsciente (chamada também incorporação “lisa”, sem interferência). Foi útil durante muito tempo, quando as religiões espiritistas careciam de credibilidade e pequenas proezas mediúnicas se prestavam a impressionar a plateia e atestar a veracidade do processo de incorporação.

A ingestão de alimentos, líquidos e objetos, inadequados ao consumo humano, – sem deixar resquícios no médium - bem como a manipulação de elementos como o fogo, só eram possíveis em incorporações inconscientes e, foram necessárias durante o período em que estas religiões estavam se consolidando. Atualmente estas práticas não são mais necessárias, e os próprios guias espirituais manifestam-se mais sutilmente, sem tomar por completo a consciência do médium.

Se o médium já não é mais um elemento desprovido de vontade, não é mais cavalo e tampouco aparelho, mas MÉDIUM: Mediador, agente intermediador da comunicação entre diferentes dimensões da vida.

- Por que motivos a mediunidade transformou-se de “inconsciente” em “consciente”?

Há muitas causas prováveis, dentre estas, alterações na realidade energética/espiritual do planeta, que demandam estudos mais profundos para serem compreendidas. Contudo, no meu entendimento – dentro daquilo que pode ser racionalmente compreendido em nosso nível de conhecimento – há duas causas principais:

  1. A elevação do status do médium de instrumento a serviço da espiritualidade para agente da espiritualidade;
  2.  A necessidade de controle e eventuais interferências do médium no processo mediúnico.

O médium agente da espiritualidade, mais que instrumento a ser utilizado pelos Espíritos Guias, é espirito em evolução, responsável por seus atos e pelos atos daqueles que se manifestam através de sua condição mediúnica.

Há um entendimento de que responsabilidades e méritos são compartilhados, os espíritos Guias não estão no comando, mas ao lado. Desta maneira, se alguma “entidade” sugerir que se prejudique alguém em benefício de outrem, caberá ao médium “interferir”, impedindo a “entidade” de manifestar-se e buscar as origens deste desequilíbrio, que pode ser da entidade ou uma manifestação de um mistificador (espíritos que se fazem passar por espíritos Guias enganando o médium, o consulente e mesmo os demais espíritos da casa).

Ao tomar em suas mãos as rédeas de sua espiritualidade, o médium deixa de ser “cavalo”. Ao aceitar a responsabilidade e o controle pelas ações daqueles que se manifestam através dele, o médium deixa de ser mero “aparelho” e passa a ser mediador, parceiro dos espíritos, enfim, MÉDIUM.


O Mito do Médium Ignorante

Desenvolveu-se ao longo da breve história umbandista a ideia equivocada de que o médium não necessita de estudo e conhecimento, pois quem realiza o trabalho são os Guias e, há mesmo quem acredite que o conhecimento pode atrapalhar, fazendo com que o médium interfira ou ainda confundindo-o.

É fato que os Guias realizarão seu trabalho ainda que seu médium nada compreenda do que está sendo feito, mas é equivocado acreditar que o conhecimento poderá atrapalhar a realização das tarefas.

O que muitos desconhecem é que os Guias utilizam-se dos recursos do médium para trabalhar, seus corpos, sua energia, seu poder mental e mesmo seu vocabulário.

O médium que conhece o funcionamento dos chacras e a circulação das energias em seus corpos, tem condições de elaborar uma rotina de meditações e práticas que visem tornar o “aparelho” mediúnico mais qualificado ao serviço que se destina.

O conhecimento acerca das conexões e energias movimentadas nos trabalhos junto aos pontos de força na natureza, bem como nas oferendas realizadas anualmente aos Guias, criará condições de uma conexão mais intensa entre médium e Guias e fortalecerá estes últimos durante um ano inteiro de trabalhos.

O conhecimento acerca dos diferentes processos obsessivos, as maneiras como se estabelecem, seus graus de complexidade e relações que se estabelecem, permitirá ao médium manter-se vigilante em sua própria vida e dos que o cercam, com ações preventivas e defensivas em relação a espíritos potencialmente prejudiciais e causadores de desequilíbrios.

O conhecimento acerca dos significados por detrás da ritualística dos trabalhos preencherá de sentido gestos vazios repetidos cotidianamente pelos médiuns, muitas vezes desconcentrados enquanto realizam alta magia de maneira mecânica.

O conhecimento acerca da realidade espiritual, suas hierarquias, as diferentes dimensões, os Tronos Divinos e suas irradiações verticais e horizontais, ascensão espiritual e evolução, queda vibratória, aprisionamentos emocionais, etc., são necessárias não somente ao desenvolvimento espiritual do indivíduo médium, como dos consulentes, dos curiosos que buscam informações acerca da Umbanda e do universo espiritual, e estas informações poderão ser utilizadas por seus Guias de consulta para explicar com clareza aos consulentes quando isto se fizer necessário, visto que é mais fácil elaborar conceitos previamente construídos na mente de seus médiuns, com vocabulário que estes possuam.

Aqui adentramos outro ponto fundamental e que se desdobra em muitos outros: O desenvolvimento da religião Umbanda no que diz respeito à formação de seus fiéis.


 Umbanda – Assistência e assistencialismo

Uma religião não se sustenta apenas no serviço prestado, por mais útil e necessário que este seja. É preciso oferecer respostas para as perguntas de sempre: de onde viemos, para onde vamos, quem é Deus, quem são os espíritos, que comportamento é o mais adequado, quais os valores morais mais elevados, por que é assim, por que é assado, o que significa isto e aquilo, etc.

Nem sempre estas perguntas serão formuladas pelos frequentadores das terreiras, então é necessário que se crie uma maneira de respondê-las mesmo assim, visto que são fundamentais à construção do saber que desenvolverá a Umbanda em seu crescimento. Mas, quando estas perguntas forem feitas a qualquer membro da corrente mediúnica, será conveniente que ele saiba esclarecer as dúvidas de quem procura respostas na Umbanda.

Convém ainda mencionar que muito do trabalho assistencialista realizado na Umbanda, é improdutivo, mero paliativo, por falta de instruções adequadas que deveriam ser transmitidas ao atendido. 

Situações obsessivas reincidentes – por exemplo – necessitam, muitas vezes, transformação nos hábitos da “vítima” que, com seus pensamentos e atitudes cria condições adequadas à aproximação de espíritos obsessores. Se estas pessoas não são orientadas na direção da reforma íntima, modificando seus valores morais e consequentemente seus hábitos, seguirão frequentando sessões de demanda durante toda sua encarnação e ao sair das sessões, espíritos análogos (quando não os mesmos) aos que foram “retirados” tornarão a se aproximar, em um circulo vicioso que resultará em pouca ou nenhuma eficácia do tratamento.

É como o médico que informa seu paciente que este deverá, além de seguir determinado tratamento, mudar seus hábitos alimentares, realizar (ou deixar de) determinados exercícios, etc. A parte estas informações individuais direcionadas a cada paciente, há orientações gerais que são transmitidas a todos, como os malefícios do fumo, da bebida e da gordura em excesso, e outras informações pertinentes transmitidas através de campanhas específicas.

Também assim devem proceder médiuns, dirigentes e os Guias de Umbanda, informando, orientando os fiéis da Umbanda acerca de seus questionamentos metafísicos, bem como fornecendo valores morais que os conduzam a uma conduta mais equilibrada em suas vidas. E isto só poderá ser feito se médiuns e dirigentes possuírem o conhecimento em questão, o que não costuma ser observado na maioria das terreiras.


A Umbanda do futuro

A Umbanda não está pronta, pouco ou nada do que é praticado atualmente permanecerá da maneira como está. A realidade física e espiritual muda, a Umbanda precisa mudar junto, e assim tem sido, ainda que aqueles que permanecem isolados dentro de suas terreiras não percebam.

Em muitos locais a Umbanda está realizando experimentações, unindo conhecimentos variados à prática da Umbanda, ampliando e aprimorando assim o atendimento oferecido. Muitas destas casas sequer adotam o nome de terreiras de Umbanda, embora grande parte da ritualística seja a mesma. Isso se deve ao patrulhamento por parte de umbandistas conservadores que buscam desqualificar o que está além de sua compreensão, determinando que a única Umbanda é aquela que lhes ensinaram.

Listo aqui algumas práticas que observei em diferentes locais e que, se mostraram eficientes em seus objetivos:

  • ü  Técnicas de Apometria para o tratamento de obsessões complexas: aumentam significativamente o alcance dos trabalhos de demanda, bem como sua eficácia.
  • ü  Linhas de trabalho oriundas de outras manifestações religiosas: podem somar-se harmoniosamente aos trabalhos praticados nas terreiras, ampliando-os, como Médicos espíritas, Povo Cigano, Caboclos Boiadeiros e Marinheiros, Exús, etc.
  • ü  Bibliotecas e grupos de estudo: orientados pelos Guias espirituais conduzem o aprendizado e a discussão acerca do universo espiritual de forma dirigida e pragmática, formando médiuns e seres humanos mais conscientes dos papéis que representam.
  • ü  Terapias exotéricas que envolvam manipulação energética e/ou promovam o autoconhecimento: são excelentes complementos aos trabalhos que visam harmonizar os diferentes campos vibratórios das pessoas atendidas. Reiki, Acupuntura, Cromoterapia, Numerologia Aristotélica, Cristaloterapia, Massoterapia, etc.
  • ü  Manter registro por escrito das regras, práticas e rituais realizados na terreira, bem como seus significados ocultos: auxiliam a construir o saber coletivo de Umbanda e facilitam na troca de experiências e teorias com outras terreiras.
  • ü  Palestras antes do início dos trabalhos: Instrui os frequentadores acerca dos valores morais a serem observados pelos fiéis de Umbanda, do funcionamento da casa e sobre quem são e o que realizam os espíritos que ali se manifestam.
  • ü  Cursos de desenvolvimento mediúnico prático e teórico: formam médiuns completos, capazes tanto de realizar os diferentes trabalhos quanto de orientar os fiéis sobre a realidade espiritual e o universo da Umbanda.

Não pensem os dirigentes, caciques, comandantes – ou como quer que sejam nomeados em suas terreiras – que estou desmerecendo o belo e importante trabalho ao qual dedicaram sua existência, pois não estou. Foi este trabalho que conduziu a Umbanda até o presente e, será a partir dele que seguiremos adiante, em direção ao futuro.

Aqueles que porventura estejam se questionando acerca do autor deste texto e suas credenciais, informo que não as possuo, mas penso que se trata aqui de algo irrelevante, pois pouco importa quem eu sou – ou quem eu penso que sou para ensinar o padre a rezar missa – e sim as ideias que manifesto. Da mesma maneira, sintam-se a vontade para concordar ou discordar, para manifestar suas opiniões e suas ideias, mas adianto que assim como não apresento credenciais, não me interesso pelas suas. Pouca – ou nenhuma - importância tem neste humilde blog seu currículo, experiência e tempo de serviços prestados a espiritualidade, ao contrário das suas ideias, que são extremamente bem vindas e de suma importância, para o blog e para o futuro da Umbanda.

Saravá!

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